Um papo musical com o músico Paulinho Costa

Como teve início a sua carreira musical?

Nós, aqui em casa, sempre tivemos uma inclinação musical. Meu pai toca violão, minha mãe também arranha um pouco e cresci em um clima bem MPB. Eles sempre gostaram. Lembro que havia um disco aqui e, quando era criança, nem dava muita bola. Só depois de muito tempo foi que percebi que era um disco do Clube da Esquina! E pensei: como nunca me toquei que tinha um LP desse aqui em casa?

E qual foi o estopim para que resolvesse aprender a tocar?

Eu tinha um colega de escola e, um dia, ele chegou no CP1 com um violão tocando “Lá, Dó e Ré”, com aquelas revistinhas da revistaria do Caruso! Eu fiquei de cara com aquilo! Parecia que o cara estava tocando muito e eu queria aprender também! Aqueles três acordes “malemá” dele me fizeram ir à revistaria, também, e procurar alguma revistinha para aprender a tocar! Eu folheava as revistinhas, procurava alguma coisa, mas não tinha nada que eu gostasse!

E qual foi a primeira música que aprendeu a tocar?

Eu estava numa fase rebelde, procurei alguma coisa que eu pudesse gostar e tirei a minha primeira música. Eu mandei uma “Eu te amo, te amo, te amo”, do Roberto Carlos!

E você se aprofundou?

Naquela mesma época, aquele meu colega soube que eu estava tentando aprender e me chamou para fazer aulas de violão com a professora Valquíria. Eu segui na onda dele e saí das revistinhas para aprender de tudo um pouco. E fui naquela até que chegou um momento em que resolvi me distanciar um pouco da MPB para tocar Rock. Foi uma fase em que fiquei mais rebeldinho ainda e, em pouco tempo, já estava tocando na igreja!

E como foi a sua fase de músico da igreja?

Eu tomei parte no coral da igreja e achei super legal! Era bacana o repertório! Eu estava gostando bastante de fazer parte do grupo, até que entrou um padre super conservador, que começou a pegar no meu pé. Mandei ele à merda.

Daí entrou no rock and roll de vez?

Sim! Aos quinze anos, eu fui à loja Socó, em Pouso Alegre, e comprei a minha primeira guitarra: uma Fender Stratocaster que tenho até hoje! Também comecei a usar o violão de 73 anos do meu pai. Um Giannini muito bom, que tirava uma sonzera. Naquela época, eu comecei a fazer conservatório em Pouso Alegre. Fiz um ano e larguei a mão. Eu estava mais a fim de jogar bola e não queria estudar o tempo inteiro. Eles tinham um ensino mais ortodoxo e, naquela época, eu acho que não entendi muito bem a proposta.

E você conhecia outros músicos da cidade?

Eu cresci vendo os músicos locais e passei a interagir com eles até os 18 anos. Vez ou outra, entrava em algum projeto mas, até então, nunca tinha tocado na noite. Lá pelos 20 anos foi que resolvi começar a tocar em barzinhos, fazer shows e encarar outros projetos. Essa fase coincidiu com a minha viagem a São Paulo. Lá, eu ficaria por 12 anos, até o início do lockdown.

Você já participou de várias bandas, não é?

De várias! Uma vez montei uma banda em Santa Rita com o Luketa, chamada “Bando do velho trem” e até mandamos fazer umas camisetas. Isso faz um tempão e, até hoje, eu vejo o Luketa com essas camisetas na rua. Acho que ele deve ter um guarda-roupa igual ao da Magali, só com camisetas dessa banda! Também cheguei a tocar com uma banda chamada Thai Stick. Toquei em alguns projetos com o Ganso e, também, com outros caras!

Como foi a sua mudança para São Paulo?

Eu não fui estudar música! Eu fui cursar psicologia! Com 20 e poucos anos, abri a minha cabeça e passei a enxergar minha vida de outra forma! Sempre tive uma relação muito dúbia com Santa Rita e aquela mudança me mostrou outros caminhos!

Paulinho e Tiago tocam para uma multidão em São Paulo.

Em termos de música, também?

Sim! Enquanto estava em Santa Rita, muita coisa que eu gostava de tocar acabava deixando de lado porque só existiam os extremos “sertanejo” e “heavy metal”. Eu gosto de ambos os estilos, mas sentia falta de outras vertentes! Em São Paulo, eu me encontrei! Conheci uma galera formada por músicos de todos os estilos, de várias praias, e vi que – na faculdade – o samba imperava entre a molecada. Eu via aquelas rodas de bar e ficava doido, querendo tocar. Eu pensava: “Se eu entrar neste samba, vou passar vergonha…” E pegava aquele ovinho de percussão pra acompanhar! Mesmo assim, no break das músicas, acabava dando umas bobeadas e os caras olhavam torto pra mim! A maior lição que tirei dessas rodas de samba foi: na dúvida, pega o ovinho! Não faz barulho, nem incomoda ninguém! Nesta onda de conhecer outros gostos musicais e de ampliar o meu leque de possibilidades, passei a tocar em uma banda chamada Tupi Balboa!

Como era a Tupi Balboa?

Era uma banda de rock autoral, em uma pegada bem brasileira. O baterista, o santa-ritense Tiago Vilela, tocava comigo. Foi uma fase bem legal!

Cheguei a ver uma apresentação de vocês para uma multidão. Do que se tratava?

Tocamos para umas 50 mil pessoas naquele dia! Foi em um evento chamado “Holi Festival”, baseado no festival das cores da Índia, que celebra a chegada da primavera. Lá, eles distribuem uns pacotinhos com pós coloridos para as pessoas. Elas passam no rosto, jogam pra cima e colorem tudo durante as apresentações. Nós tínhamos acabado de lançar o nosso single e foi uma experiência incrível tocar para tanta gente! O Ibirapuera estava lotado e eu só vi aquele pó colorido voando.

E o curso de psicologia?

Eu larguei a faculdade e entrei de vez para o meio musical. Fui estudar produção no IAV (Instituto de Áudio e Vídeo) e virei estagiário de uma empresa que produzia som para eventos. Meu trabalho, naquele período, era conectar som, cabear e operar o áudio. Foi um momento em que passei a viver de música, mas sem atuar como músico! A Tupi Balboa havia acabado de se dissolver e comecei a atuar, também, como locutor, na Rádio Brasil 2000.

Como foi a sua experiência como locutor na Rádio Brasil 2000?

Pouco antes da banda terminar, a Tupi havia tocado no Grito Rock, ganhamos visibilidade e passamos a nos apresentar no Brasil inteiro. Nesse período, acabei fazendo amizade com muitas pessoas, conheci muita gente, dentre elas um cara que era da família dos donos da Brasil 2000. Foi através dele que eu recebi o convite!

A Brasil 2000 é muito famosa, não é!?

Até os anos 80 e 90, a Brasil 2000 havia sido uma rádio famosíssima e perdeu espaço com a popularização da internet. Até então, todo mundo que fazia sucesso no meio musical batia ponto naquela emissora. Tim Maia, Raul Seixas… ninguém ficava de fora. Quando o público começou a reduzir, a rádio mudou o nome para Tropical FM, buscou um novo segmento, e a Brasil 2000 passou a ser transmitida online. Foi aí que recebi o convite deste meu amigo. Ele disse que eu conhecia várias histórias engraçadas, sabia falar sobre música e que poderia me dar bem como locutor. Eu aprendi a mexer nos equipamentos, recebi umas aulas e dei início ao programa “Camarão Blues”. Um programa que tinha o blues como protagonista, mas que mostrava como o estilo impactou vários outros, principalmente o rock. Junto com um amigo meu, o Rafael, passei a me apresentar ao vivo na rádio, tocando versões de bandas como a Led Zeppelin, que bebia desta fonte para produzir o seu rock inglês. Nós percebemos que aquelas apresentações podiam dar liga e criamos uma banda.

Camarão Blues é outro projeto de Paulinho.

A Camarão Blues foi da rádio para o barzinho?

Sim! Nós montamos uma banda e, para aproveitar a visibilidade que o nome “Camarão Blues” estava tendo na internet, decidimos usá-lo neste novo projeto! Aquilo coincidiu com um momento em que eu estava ouvindo muitos sons diferentes. Estava escutando e tocando muito “Clube da Esquina”, “Mutantes”, “Secos e Molhados” e música brasileira em geral. Tudo aquilo serviu como referência para meu novo trabalho. Começamos a tocar nos barzinhos. Tocávamos de Robert Johnson a Tião Carreiro.

Um som lembra muito o outro!

Eu acho a pegada deles muito parecida, embora a temática seja totalmente diferente. Ambos são entidades e primos em seus estilos. Robert Johnson sofria racismo e contava sobre o seu cotidiano. Tião Carreiro já falava sobre amor, traição e causos.

E a banda decolou?

Tocamos muito em barzinhos e fizemos shows em várias cidades! Chegamos a passar quatro dias seguidos fazendo shows em cidades diferentes. O show terminava, nós entrávamos no carro e partíamos para outro lugar. Foi um momento muito bom! Paralelo a este trabalho, cheguei a tocar em um projeto de Funk Soul do Rafal e fizemos um tributo ao Secos e Molhados. Nós começamos a tocar muito Caetano, Gilberto Gil, Black Sabbath, Alice Chains e Luiz Caldas! Comecei a tocar mais samba, baião e aprender novos estilos!

E como a pandemia impactou a sua vida?

Foi ruim para todo mundo que vivia da música e comigo não foi diferente! Acabou show, acabou evento, os meus alunos desistiram de ter aulas de música e eu fiquei sem saber o que fazer! Da noite para o dia, a pandemia veio e passou a foice! Deu aquela ceifada e perdi os meus projetos e a minha renda. Curiosamente, houve um ponto positivo nesta história. Eu comecei a dar aulas online e aquilo deu certo! Muita gente fazendo home office, sem muito o que fazer em casa, que começou a buscar uma nova skill. Acabou que as aulas online deram certo! Eu passei seis meses com uns amigos em Atibaia e decidi voltar para Santa Rita!

E como foi o seu retorno a Santa Rita?

Voltar a Santa Rita foi meio que reconectar ao meu passado! Todos os gatilhos santa-ritenses foram acionados, mas também aconteceram muitas coisas boas! Eu já não me lembrava mais como era o silêncio. Minha vida era um caos, com eventos e atividades diárias que silenciaram com a pandemia e, muito mais, com a minha vinda para Santa Rita! Foi muito melhor passar a pandemia aqui do que em São Paulo. Eu estava diante de uma situação que não tinha certeza se tratava de um apocalipse zumbi ou de uma bobeirinha, mas não queria arriscar. E eu comecei a me reconectar com os amigos daqui! Um destes amigos foi o Daniel Fernandes, o Dani Boy, que é um grande compositor santa-ritense e com quem eu já havia trabalhado antes. Ele me mostrou algumas músicas, eu gostei muito e disse: “Se algum dia você for gravar essas músicas, me chama para tocar com você! Este som é muito legal!” Calhou de surgir um edital do Cidade Criativa e decidimos inscrever um projeto para gravar!

Este seu projeto é com o Sapucabardos?

Sim! É um projeto que vem falar da vida no campo, da vida do trabalhador… A cidade tem um histórico grande com a agropecuária, com a cidade evoluindo a partir deste setor, desde os tempos da escravidão, passando pelos boias-frias, até os dias de hoje. Estas contradições e elementos que definem o perfil da cidade são muito abordadas sob esta análise. O resultado final ficou uma sonzera, com uma pegada filosófica e que fala muito da nossa realidade!

Você também gravou com o “Rua Nestor”?

Gravei seis músicas com o Ganso e o Paulista neste projeto de músicas autorais! A verdade é que estão acontecendo eventos muito legais em Santa Rita! Tem muita coisa legal rolando e, culturalmente, através de iniciativas como o Cidade Criativa, a gente tem dado pau em muita cidade de porte maior. Olha o tamanho de Pouso Alegre! Do ponto de vista cultural, nós damos um pau neles! Brincadeiras à parte, para mim, estar aqui e em paz me ajudou a refletir um pouco e a pensar em outras possibilidades. Estou trabalhando como produtor, arranjador, músico e professor e ainda há muitos trabalhos que quero executar!

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