(Carlos Romero Carneiro)
Em cada esquina de Santa Rita do Sapucaí existe uma boa história — e algumas delas são tão inusitadas que atravessam gerações. Uma dessas histórias é a do estudante Jorge Hiroshi Sumita (ou Sumida), o japonês irreverente que marcou os tempos do Inatel nos anos 1960 com suas travessuras, amizade e carisma inesquecível.
O hóspede da Rua Antônio Moreira
Tudo começou quando Dona Lazinha, conhecida pelas colchas de tricô que costurava com esmero, recebeu um visitante inesperado à porta de casa: um jovem japonês que se apresentava como Jorge Sumita. Ele havia visto o anúncio do aluguel de um sobrado na Rua Antônio Moreira — justamente a casa onde, mais tarde, nasceria o narrador dessa história.
Educado, simpático e de humor contagiante, Sumita logo conquistou a confiança da dona de casa e de toda a vizinhança. Mesmo com o estranhamento inicial dos filhos de Dona Lazinha, o novo morador acabou se tornando um amigo inseparável. “O Luiz Carlos tinha ciúme no começo, mas depois viraram irmãos”, recorda Yvelise de Fátima, filha da proprietária.
O fusquinha azul e as loucuras de estudante
Quem conviveu com Sumita no Inatel lembra de seu inseparável Fusca azul, protagonista de incontáveis aventuras. Em uma delas, o carro chegou a capotar dentro da faculdade — um episódio que virou lenda entre os colegas. Wagner “Gaiola” Matragrano recorda com risadas: “Ele dirigia do lado direito, fingindo que o carro andava sozinho!”.
Outra de suas “artes” favoritas era subir o cruzeiro, girar o carro e piscar os faróis para depois descer à praça dizendo que tinha visto um disco voador. Brincalhão, criativo e dono de um humor peculiar, Jorge era o tipo de figura que ninguém esquecia.
Mas o mesmo entusiasmo não se repetia nos estudos: os amigos contam que, para tirá-lo da cama, às vezes precisavam ligar uma sirene parecida com a da Estamparia — dentro do quarto!
A visita dos pais e a “formatura imaginária”
Cinco anos depois de chegar a Santa Rita, Sumita recebeu uma visita inesperada: seus pais chegaram de Londrina, a bordo de um luxuoso Impala, acreditando que o filho finalmente se formaria engenheiro. A surpresa veio quando descobriram que a formatura ainda estava longe. Para evitar o embate, Sumita alegou ter perdido a chave da casa. “Eu pulei a janela e abri por dentro. Ele ficou bravo, mas teve que contar a verdade”, relembra Luiz Carlos.
A rua do coronel japonês
Já morando próximo ao Inatel, Sumita enfrentou outro problema curioso: a rua onde vivia ainda não tinha nome. Para resolver a situação e conseguir se corresponder com a família, ele mesmo confeccionou uma plaquinha com os dizeres ‘Rua Dr. Jorge Sumita’ e fixou em um poste. A brincadeira durou anos — e, segundo contam os antigos moradores, a placa permaneceu ali até que alguém finalmente descobriu o trote e trocou por uma oficial.
De Santa Rita ao Japão
Mesmo após se formar, Jorge Hiroshi Sumita nunca rompeu seus laços com Santa Rita. Continuou visitando a cidade com os amigos Minguinho, Jayro e Evaristo, viajando todo fim de semana de São Paulo até o sul de Minas — às vezes com uma luz de sirene instalada no carro, apenas para pregar peças nos motoristas pelo caminho.
Casou-se com uma japonesa, teve duas filhas e, anos depois, mudou-se para o Japão. Segundo a amiga Marines Shimitz, um “Sumita louro e encaracolado” chegou a ser visto novamente em Santa Rita há muito tempo, mas desde então não deu mais notícias.
Através do contato com seu grande amigo Jayro Franco Longuinho, foi possível encontrar uma fotografia e um e-mail de Sumita — mas o velho estudante nunca respondeu. Ainda assim, aqueles que o conheceram continuam guardando com carinho as histórias que ele deixou.
No fundo de uma gaveta, uma caixinha de música com inscrições japonesas, esquecida no sobrado da Rua Antônio Moreira, ainda guarda o retrato de um casal oriental — possivelmente seus pais. É o último vestígio material de um personagem que marcou época, deixando sua marca de alegria, irreverência e amizade na história santa-ritense.
