O grande roubo da igreja Matriz

(Por Cônego Augusto José de Carvalho)

Lembro-me que, em 1934, ladrões assaltaram a igreja matriz de Santa Rita. Roubaram tudo que puderam: vasos sagrados, dinheiro dos cofres, toalhas de linho e, com requintes de sacrilégio, arrombaram o Sacrário, retirando dali as píxides, tendo antes espalhado pelo chão as Hóstias Consagradas.

Monsenhor João Calazans Nogueira, o piedosíssimo Vigário, pouco se importou com a vultuosidade material do roubo, mas chorou amargamente o sacrílego atentado ao Santíssimo Sacramento da Eucaristia. Pediu, então, ao Bispo Diocesano que retirasse, quam primum, a pena de execração por que havia passado o templo de Deus em Santa Rita do Sapucai. Não se esqueceram os ladrões de levar consigo o molho de chaves que encontraram na sacristia. Com elas, haviam aberto o Sacrário, os cofres e as gavetas das cômodas, onde se encontravam as toalhas e mais alfaias. Antes de deixar a igreja, tiveram o desplante (atrevimento) de escrever com carvão do turíbulo, na parede de fundo da sacristia, o seguinte recado:

Monsenhor Calazans, as chaves estão no fundo da lagoa do bicho. Mande o Artur sacristão buscá-las, se não tem medo do Minhocão. . .

Tal recado tirou um sorriso de desdém do velho padre de Santa Rita. Sorriso que, lá no seu íntimo, era um ódio sagrado pelo que tinham aprontado os ladrões… Para uma boa faixa de gente, no entanto, o fato só trouxe mais pavor do bicho que ainda morava no fundo da lagoa. Era o medo de que o tal de Minhocão pudesse ainda vir aborrecê-los (os tolos) com as chaves, abrindo suas portas ou tirando-lhes o sossego na então gostosíssima terrinha de Santa Rita.

De há muito que a lagoa do bicho secou. Um aterro de 8 metros, desde o nível das águas do Sapucaí, na época dos guinchos e das escavadeiras e outras máquinas de remover terras e de aterrar aplainou toda a área alagada, para ali se construir a moderna Escola Técnica de Eletrônica da cidade. Com isso, D. Sinhá Moreira e os Padres Jesuítas levantaram um monumento que é a maior Escola do gênero em todo o Brasil. Destruindo a lagoa e canalizando o córrego do Mosquito, afastaram para sempre o pavor do Minhocão, o inferno dos pernilongos e o fantasma das epidemias sem, no entanto, destruir o folclore, que recordei agora, para o conhecimento dos novos santa-ritenses ou os alienígenas (mas que amam sua nova terra), os que aportaram à Santa Rita nos dias atuais. Se assim procedi, contando a história do Minhocão e da Lagoa do Bicho é porque, como historiador da terra que estimo como minha, jamais poderei desprezar o seu folclore que vem enfeitando, desde o final do século dezoito, as paragens do Mosquito e de seu irmão gêmeo, o ribeirão do Vintém.

(Texto Extraído da Obra “O Menino do Balaio”, do Cônego Carvalhinho)

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