(Por Patrícia Vigilato)
Esse texto é fruto da serendipidade. Isto é, quando descobrimos ou encontramos alguma coisa enquanto estávamos procurando outra, mas para a qual já tínhamos que estar, digamos, preparados. Havia traçado mentalmente sobre o que escreveria na coluna deste mês, mas foi preciso desistir. Foi aí que aconteceu a serendipidade.
Organizando minha estante, encontrei o livro ‘Assim se benze em Minas Gerais’, de Edmilson Pereira e Núbia Gomes, que ainda não tinha tido a oportunidade de ler. O livro é um estudo sobre a cura através da palavra, devoção e cultura popular de Minas Gerais. Entre tantas manifestações marcantes da cultura mineira, a religiosidade me desperta curiosidade.
Ainda diante da estante, abri o livro e li, “a presença da mulher é marcante no mundo da religiosidade popular e é ela, numa maioria absoluta, quem conhece o poder das palavras e dos gestos”. Lembrei-me do livro escrito pelo amigo Jonas Costa, ‘A Rainha Operária e sua Colmeia Negra’, de valor cultural inestimável sobre a maior líder popular santa-ritense, Maria Idalina de Jesus, Maria Bonita (1902-1997).
No capítulo intitulado ‘Fé, Cura e Sabedoria’, Jonas discorre sobre a religiosidade de Maria Bonita, “sempre procurou manter-se fiel ao catolicismo, mas professava sua fé de maneira eclética, heterodoxa, a partir do entendimento simples a respeito do transcendental”. Num trecho mais adiante declara, “Maria encarava as benzeduras, benzeções ou benzimentos como dom e missão”, descreve os diferentes tipos de benzimentos, traz relatos de santa-ritenses auxiliados por ela e cita mais duas benzedeiras que, segundo ele, estavam entre as mais famosas da cidade, Maria Curandeira, da Rua Capitão Ribeiro do Vale (Rua do Queima), e Justiniana, do Bairro Matadouro.
Ainda se benze em Santa Rita do Sapucaí? Acredito que as práticas religiosas populares têm sido (re)significadas. Neste viés, crenças e tecnologias dialogam no enfrentamento entre tradição e modernidade. Entretanto, vale considerar a essência da fé, as permanências e (re)criações das práticas de sociabilidades.
Em tempos de desesperança, creio ser ainda mais importante resgatar saberes, olhar para o passado e aprender com ele. Infelizmente, não tive a oportunidade de conhecer pessoalmente nem uma das mulheres citadas pelo Jonas. No entanto, reconheço a magnitude de cada uma delas e entendo que, quando a história é contada, a ancestralidade toma forma tornando-as imortais. Que as histórias sejam sempre contadas e que nunca deixemos de reverenciar os(as) que vieram antes de nós!