A família do Monsenhor José veio de Cruzeiro para o Sul de Minas em busca de novos desafios. Seu pai – Victor de Souza Pinto – era tipógrafo e passou por várias cidades antes de se instalar, definitivamente, em Santa Rita do Sapucaí. Em todos os locais por onde esteve, se mudou a convite do irmão, Cônego Adolfo.
Monsenhor José contou que, na infância, seu tio ganhou um automóvel em um sorteio – uma Baratinha – e usou o dinheiro para comprar um sitiozinho em Borda da Mata que seria administrado por seu pai. Nesse período, para estudar, precisava andar 5km de charrete, além de trabalhar na lavoura.
Com a imensa dificuldade, seu pai decidiu vir para Santa Rita e tentar ganhar a vida. Aqui, as condições não seriam mais fáceis, já que seu avô havia perdido tudo na queda do café, em 1929, e tentava recuperar um pouco do que tinha conquistado. Foi um tempo em que José e seus irmãos ajudavam a produzir farinha, canjiquinha e outros produtos para sustentar a família.
Assim que chegou à cidade, Victor de Souza Pinto, seu pai, teve uma vida muito participativa e foi grande o seu auxílio ao Hospital e também à Associação dos Vicentinos, onde atuou como tesoureiro.
Em 1934, Monsenhor José iniciou os seus estudos em Pouso Alegre, onde passaria os próximos cinco anos. Mais tarde, matriculou-se em Mariana, onde faria dois anos de preparação para, em seguida, estudar Teologia e Filosofia no Seminário Maior de Mariana.
Ao retornar para Minas, Monsenhor José ordenou-se em Pouso Alegre, em dezembro de 1946. No tempo em que lá esteve, além de atuar na Catedral, lecionou no Seminário e atendeu Congonhal, onde seria necessário viajar duas horas e meia – a cavalo – para chegar ao destino.
A próxima cidade que recebeu os seus trabalhos foi Paraisópolis, onde percorreu diversas capelas, desempenhando o seu trabalho com muita dedicação. Para ele foi uma experiência muito intensa e gratificante.
A vinda para Santa Rita do Sapucaí aconteceu em 1953, a pedido do Bispo. A nomeação de Pároco aconteceu em 1957, ano da maior festa da padroeira que a cidade já teve notícia e que Monsenhor José ainda se lembrava com muito carinho.
No início, Monsenhor José atuava sozinho. Nos anos seguintes, padres redentoristas vieram para ajudá-lo e permaneceram na cidade por 6 anos. No final da década de 1950, começaram a chegar os primeiros jesuítas com a missão de fundar a ETE e colaborar na evangelização. Para o Monsenhor, Dom Vaz foi um importante aliado no desenvolvimento da Paróquia. Juntos, construíram as Igrejas de Fátima, São José Operário, Santa Luzia, São Sebastião e outras obras que foram se espalhando por todo o município.
Escolinha de Fátima e Escola de Comércio
No âmbito social, Monsenhor José contou com imenso apoio de Dona Sinhá Moreira e também da comunidade na criação da Escolinha de Fátima e de outras instituições que ofereciam educação gratuita aos santa-ritenses. Quando soube da notícia de que a Escola de Comércio estava sendo vendida, Monsenhor José foi apoiado pela precursora do Vale da Eletrônica para que a Paróquia comprasse a instituição que, hoje, é conhecida como Colégio Tecnológico Delfim Moreira.
A criação da FAI
A FAI foi outro exemplo do dinamismo do Monsenhor José à frente do Educandário Santarritense. Ao lado do Professor Francisco Magalhães e do Professor Teixeira, decidiu criar uma Faculdade de Administração. Como ainda não tinham experiência nesse ramo, encontraram na Fundação Getúlio Vargas o apoio que precisavam para dar início ao projeto. Além de todas as informações necessárias, tiveram o empréstimo de três professores da renomada instituição paulista. O curso de informática surgiu quando o Padre Ramon conseguiu um computador do tamanho de uma sala onde, inicialmente, realizavam o serviço de contabilidade de 27 municípios. Era o primeiro passo para a criação de uma faculdade que se tornaria referência no país.
INATEL
Para a fundação do Inatel, a contribuição do Monsenhor José, nos primeiros anos, foi indispensável. O prédio do IMEE (Instituto Moderno de Educação e Ensino) havia sido comprado pela paróquia e acabou cedido ao Instituto Nacional de Telecomunicações mediante pagamento, em 10 anos, de 50 mil, valor muito inferior ao que havia sido comprado, 3 milhões e duzentos mil.
Reforma da Matriz
Ao mesmo tempo em que revolucionava a cultura e a educação de Santa Rita do Sapucaí, o trabalho na pastoral não cessava e Monsenhor José também permaneceu firme em suas obras – mais tarde em duas paróquias.
A reforma da Igreja Matriz, outra obra liderada pelo Monsenhor, foi um de seus grandes desafios. A ideia inicial era construir uma nova, mas optaram por uma boa reforma, sendo necessário promover muitas festas para levantarem recursos e realizarem todos os reparos necessários.
Trinta e dois mil e quinhentos batizados
Assim que completou 50 anos de Ordenação, a Paróquia fez um levantamento do número de batizados realizados pelo Monsenhor José: trinta e dois mil e quinhentos. Casamentos, até aquela data, somavam quase 8000. Naquele mesmo ano, seria reconhecido pelo Vaticano por suas obras, ao ser convidado a comemorar o seu jubileu de ouro junto com o Papa João Paulo II.
Descanso?
Aos 75 anos, Monsenhor José pediu aposentadoria, mas continuou trabalhando. Mesmo depois de ordenado, manteve uma vida muito agitada e com visitas regulares aos diversos bairros rurais, espalhados por todo o município. Assim permaneceria pelos 25 anos seguintes.
O santa-ritense do século
Monsenhor José foi uma personalidade que esteve entranhada no DNA dos santa-ritenses por um século. Não havia quem visse a sua feição serena e sorridente, ou que ouvisse o seu famoso “Viva Santa Rita!!!” e não fizesse uma viagem introspectiva à própria essência. Padre José, como nos referimos carinhosamente, está guardado em nossas memórias mais felizes e também em nossos corações… ali bem juntinho de Santa Rita de Cássia, nossa Santa dos Casos Impossíveis. E este sentimento de querer bem, de se sentir melhor na presença desta personalidade que empenhou toda a sua vida em prol desta terra, não é privilégio somente dos católicos. Sua existência ultrapassou as barreiras sectárias e fez dele, um homem amado por pessoas das mais diferentes religiões, filosofias e pensamentos.
Se levantássemos uma relação das pessoas mais importantes da história de Santa Rita do Sapucaí, em todos os tempos, seguramente o Monsenhor José Carneiro Pinto fulguraria entre os dez primeiros nomes, em uma lista de ilustres personalidades. Toda a história recente do município, como a criação do Educandário Santa-ritense, responsável pela Escola Técnica de Comércio (que depois veio a se tornar o Colégio Tecnológico Delfim Moreira) e também pela FAI, passando pela fundação da ETE e a criação do INATEL, somando-se a tantas outras iniciativas que nos dão orgulho, possuem sua participação decisiva e olhar amoroso para com a comunidade santa-ritense.
Se hoje parece impossível imaginar nossa cidade sem obras como o Santo Cruzeiro, a capela de Santa Rita de Cássia, a Matriz renovada e com todo o seu esplendor, e tantas outras obras espalhadas pelo município, talvez o panorama fosse bem outro, caso o Monsenhor José não permanecesse tanto tempo por aqui. Ele esteve fora por alguns anos, emprestou o seu nome a uma escola na cidade de Paraisópolis e a uma biblioteca em Bela Vista, mas retornou para a sua amada Santa Rita.
Muito além da liderança e da autoridade moral exercidas por ele nestes anos todos, Padre José significa um exemplo de vida e um caminho para a espiritualidade. Feliz daquele que teve a oportunidade de viver em companhia de alguém capaz de trilhar os ensinamentos do Cristo e transmitir todo o aprendizado através de seus próprios exemplos! “A palavra convence, mas o exemplo arrasta!”
Tivemos, nestes anos todos, a oportunidade de conviver com uma alma abençoada e fomos agraciados com algo ainda mais incrível, no dia 20 de outubro: comemorarmos junto ao querido Monsenhor José os seus 100 anos de existência. Ele, que esteve ao lado de personalidades que tanto admiramos e que participou de passagens que só conhecemos por jornais, fotografias e velhos documentos, continuou ao nosso lado, nos bons e maus momentos, transmitindo vibrações sutis e elevadas. Foi, sem sombra de dúvidas, um dos maiores líderes de toda a história de Santa Rita do Sapucaí.
Querido Padre José, que nunca revelou em quem votava ou para qual bloco torcia e que tantas bênçãos nos proporcionou nestes anos todos… Querido amigo! Gostaríamos de agradecer pela presença amiga e fraterna, pelas obras espalhadas por toda a cidade e pelo exemplo de espiritualidade e doação. Neste dia 21 de julho de 2022, nos despedimos de nosso grande líder e amigo. Viva Padre José!
Vídeos sobre o Monsenhor:
Missa celebração dos 100 anos do Monsenhor
Depoimento que ele deu ao Inatel
(Carlos Romero Carneiro)