Herança do povo de Minas Gerais (Por Cyro de Luna Dias)

Praça Santa Rita no dia 7 de setembro de 1929. Note que uma bandeira está sendo hasteada no Fórum.

A distância dos centros populosos, a aspereza das serranias e a dificuldade dos transportes, criaram um povo livre que esconde a sua altivez sob aparência humilde e submissa. Na Montanha nasceu a ideia da independência e a vontade de voar: Felipe dos Santos e Santos Dumont, filhos da mesma cordilheira, separados por dois séculos. Joaquim José da Silva Xavier, arauto dos seus sonhos, galopou por altas trilhas entre povoados aninhados no vale, pregando a criação de uma pátria para os brasileiros. No sagrado vale do Sapucaí, Bárbara Heliodora, descalça, cabelos soltos ao vento e vestes dilaceradas, vagava chamando os nomes dos mortos e dos exilados. Senhora de muitas montanhas, tudo lhe foi espoliado, mas a ânsia de liberdade que a enlouqueceu, é herança do povo de Minas Gerais. Uma gente calada, trabalhadora, cristã, unida na dor e na alegria, pronta para ajudar e socorrer nas horas de angústia. A solidariedade nascida do isolamento é quase fraternal.

Antônio de Cássia negociava com a fatura da mercadoria em cima do balcão. O seu lucro era vinte por cento sobre o custo dos objetos e os fregueses compravam para pagar no fim do ano, ou quando vendessem as suas colheitas. Naquele tempo, não se falava em juros, exceto nos bancos ou nos agiotas. A civilização católica sempre repudiou a possibilidade do “dinheiro parir dinheiro”, pois a moeda representa o fruto do trabalho. Acusam aos judeus a invenção dos juros, que os teriam criado na Idade Média, mas a incriminação é injusta. Os grandes santuários gregos, como o Templo de Delos, exerciam a função de bancos e cobravam dez por cento de juros, três mil anos antes.

Leopoldo de Luna contava que, durante a primeira guerra mundial, devido ao aumento do seguro dos riscos de guerra, as firmas inglesas subiram o custo das enxadas “duas caras” e arados “Oliver”, mas avisaram antes da alta, explicando os motivos. Papai tinha um depósito no porão de sua casa com muitas caixas de enxadas e pontas de arados. Avisou aos fregueses que, terminando o estoque, haveria alta nos preços e continuou vendendo pelos preços antigos, sabendo que a renovação do material lhe custaria vinte e cinco por cento. Cássia negociava assim pois sabia que teria que prestar contas a Deus pelos seus atos e, principalmente, pelos seus lucros.

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