Meio século de história, antes das grandes escolas (Por Salatiel Correia)

Eu estou diante de uma folha em branco e à procura de assunto relevante para escrever sobre a história de Santa Rita do Sapucaí. Vou, então, ao Youtube e lá encontro a reveladora entrevista concedida pelo senhor Dedé del Castilho, filho da saudosa dona Hespanha; esta ainda viva na memória, desde os tempos que eu era ainda um rapazola, há exatos quarenta e dois anos, quando estudava engenharia no Inatel. A entrevista em questão foi muito bem-conduzida pelo ex-vice-prefeito de Santa Rita, Doutor David Kallás, este filho do grande médico Elias Kallás.

As reveladoras informações do senhor Dedé del Castilho me conduziram a um mundo cujo contexto ainda não existia, para mim e para Santa Rita, grandes mestres que tive no Inatel, como os de há muito cidadãos santa-ritenses, José Antônio Justino Ribeiro, Adonias Silveira, Navantino Dionísio, José Augusto Baeta, entre outros.

Da memória viva do senhor Dedé del Castilho brotavam lembranças de uma Santa Rita movida pela educação e pela política da Velha República, quando imperava o prestígio do ministro Bilac Pinto, de seu sogro Francisco Moreira e do presidente Delfim Moreira.
Dito isso, voltemos a lupa do tempo santa-ritense, há exatos 108 anos. Estamos em 1912. Nesse ano, um filho de Alfenas, João de Camargo, fundou um colégio que marcou época em Santa Rita: o Instituto Moderno de Educação e Ensino (IMEE).

Dirigido pelo saudoso professor Henrique del Castilho (marido da dona Hespanha), o IMEE teve um papel relevante na educação de milhares de santa-ritenses e não santa-ritenses que para lá iam estudar. Ainda nos anos de 1920 (1926), o coronel Chico Moreira fundou, com Clemente de Faria, o banco, que tanto serviu ao povo desta terra, o Santarritense. Tendo Clemente de Faria como presidente e o coronel Francisco Moreira como diretor, o Banco Santarritense contava, nos seus quadros, com um funcionário que, anos mais tarde, iria ter um destacado papel na política nacional. Falo do ex-governador de Minas Gerais e ex-ministro das relações exteriores José de Magalhães Pinto.

Anos mais tarde, uma contenda entre Clemente de Faria e o coronel Chico Moreira resultou na saída do respeitado líder político da região, então, afastando-se do banco que ajudara a criar. Absolutamente leal ao sogro de Bilac Pinto, José de Magalhães Pinto apoiou o líder político santa-ritense e juntos fundaram, em Santa Rita, um banco que se tornaria uma potência econômica no Brasil – o Banco Nacional.

A história de Santa Rita não poderia se completar sem a personagem que se mantém viva na memória do povo desta terra, mesmo passados quase 60 anos de seu falecimento. Falo de Luzia Rennó Moreira, carinhosamente chamada de Sinhá Moreira.

A respeito da maior benemérita de Santa Rita, o testemunho do senhor Dedé del Castilho é absolutamente revelador. A primeira grande revelação se refere à ida de dona Sinhá (já casada com um primo que era secretário da embaixada) para o exterior. Lá, ela visitou o Japão e ficou maravilhada com o que vira, com a revolução da eletrônica usada como instrumento do desenvolvimento daquele país asiático. Dois anos depois, já desquitada, dona Sinhá retornou a Santa Rita com o propósito de fundar uma escola de eletrônica na cidade.

De acordo com o testemunho do senhor Dedé del Castilho, todavia, a história não foi bem assim. Ao retornar do Japão, a cunhada do ministro Bilac Pinto se dedicou, por décadas, à nobre tarefa de cuidar dos pais. Só nos anos de 1950, ela intencionou criar um curso superior de química na cidade. Quem a demoveu dessa ideia foi um médico que, na condição de funcionário graduado da Nestlé no Rio de Janeiro, visitara o Japão e lá, como dona Sinhá, testemunhara a revolução da eletrônica. Nome do médico: Valter Telles. E foi assim que, convencida, pelo doutor Valter Telles, dona Sinhá (apelido que, segundo o entrevistado, ela não gostava) se juntou aos jesuítas e, com eles, fundou a primeira escola de eletrônica na América Latina. Desse modo, nasceu a ETE. Com muita justiça, dona Luzia Rennó Moreira se tornou a maior benemérita dessa sociedade de Santa Rita do Sapucaí. E não só pela fundação da escola de eletrônica, mas também por ela, com recursos próprios, ter sido peça fundamental na construção do bairro Vista Alegre. A generosidade da maior benemérita de Santa Rita contemplou inúmeros estudantes pobres com bolsas de estudos. Esses estudantes que se tornaram doutores, os pobres que conseguiram ter uma casa no bairro Vista Alegre e os milhares de estudantes formados pela Escola de Eletrônica Francisco Moreira da Costa mantêm vivos na memória, passada de pai para filho, a imagem de dona Sinhá Moreira.

Esta história ficaria incompleta sem a menção à fundação do primeiro curso de engenharia de telecomunicações no país. Falo do Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel). De início, o seu fundador, professor José Nogueira Leite, intencionava fundar a escola em Itajubá. Mas lá na terra do ex-presidente da república Wenceslau Braz não existia prédio que comportasse uma escola desse porte. Quem convenceu o professor Nogueira Leite a fundar a escola em Santa Rita foi o professor Fredmark Leão, este, por acaso, meu professor e de milhares de engenheiros formados no Inatel.

Casado em Santa Rita e tendo trabalhado na cidade, o professor Fredmark conhecia as excelentes instalações do tradicional Instituto Moderno de Educação. Aceita a sugestão de meu querido mestre, o Inatel se mantém, passados 55 anos de sua fundação, mais vivo do que nunca lá no alto da avenida que traz o nome do fundador do Instituto Moderno de Educação: João de Camargo.

Ao encerrar estes escritos, não poderia deixar de registrar o espírito empreendedor do grande líder político de Santa Rita, Coronel Francisco Moreira da Costa; e de dona Luzia Rennó Moreira, na condição de benemérita de uma sociedade. Como também não poderia deixar de mencionar a importância histórica de nomes como os já citados João de Camargo, Valter Telles, José Nogueira Leite e o professor Fredmark Leão.

Quanto ao doutor David Kallás, pessoa que conheço de nome graças às excelentes informações que foram prestadas a seu respeito pelo meu dileto amigo José Elcio Marques – este proprietário da tradicional Casa Marques – vai aqui um abraço pelo excelente trabalho que faz em registrar, para a posteridade, a história de nossa querida Santa Rita do Sapucaí.

Salatiel Soares Correia é engenheiro, Mestre em Ciências pela Unicamp. Autor, entre outras obras, de Cheiro de Biblioteca. Vive em Goiânia. E-mail: salatielcorreia1@hotmail.com

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