Coluna do Carlos Romero

Esse era lambão! (Por Carlos Romero Carneiro)

Quem viveu os anos 80 no morro do José da Silva sabe como a vida era movimentada e hilária naqueles tempos. Era uma época interessante. Havia o Armazém 1001 artigos, a farmácia do Seu Rui, a movimentação em torno do grupão, os habitantes da Rua Nova, a correria dos carnavalescos e a oficina de refrigeração do meu pai.

Macarrão cresceu aqui, ora ajudando o Seu Hugo com a entrega de botijões de gás, ora fazendo trapalhadas na oficina. Foi naquela época que uma cliente, ao tomar conhecimento de que seria dele a missão de pintar o seu freezer, soltou a pérola: “O macarrão, não! Ele é muito lambão!” Dali para a frente, todo mundo virou lambão, a criançada da rua virou lambinha e a mulherada virou lamba. Foi uma febre na cidade.

Quando popularizou o seriado do Chaves, Macarrão (que havia ganhado este apelido do meu pai, pra variar), deu de chamar todo mundo de “gentalha”. Com aquele bigodinho, ficou mesmo parecido com o Seu Madruga, o que lhe rendeu outro apelido. Certa feita, chamou um vizinho mais sério de gentalha e recebeu uma visita, minutos depois. O dentista chegou com um dicionário debaixo do braço e lhe apresentou o significado da palavra: “Gentinha, Gentaça… Tá vendo? Não pode sair por aí chamando as pessoas disso!” E adiantou? Adiantou nada! Todo mundo que passava na rua era zoado por ele e por seu amigo inseparável, o Joaquim, também conhecido como Traia (ou Tralha, na língua culta). Esse mexia tanto com os outros que até facada levou… outra figura inesquecível do morro do Zé da Silva.

Se existia alguém que gostava do serviço mal feito, esse alguém era o Macarrão. Lembro do dia em que “esqueceu” de recolocar lã de vidro depois da pintura e uma geladeira começou a gelar do lado de fora. E o rapaz não tentou entregar assim mesmo? Formou uma camada de gelo na porta, o que lhe rendeu outra história. Tudo que era geladeira tinha as digitais de Macarrão que sequer esperava a tinta secar para entregar o serviço. E dá-lhe tiração de sarro, não importava quem passasse. E dá-lhe moeda colada no chão, purgante na cerveja, maçarico no alicate, zoação e choque no banquinho.

Um caso que virou lenda na vizinhança foi quando Taylor Carneiro reparou que sua conta de luz havia triplicado de um mês para outro. Reclamou na Cemig, chamou especialistas, trocou a fiação… Nada dava resultado até se lembrar de que Macarrão havia montado uma oficina ao lado. Não deu outra… chegou ao estabelecimento do amigo e notou que um fio saía da parede de sua casa e ia direto ao compressor. “Não é possível, Macarrão!”
Aquele sujeito fez tanta diferença na minha vida, com suas brincadeiras e trejeitos, que dediquei uma monografia a ele, sabe-se lá por que. Da última vez em que o vi, foi em uma visita que fez ao jornal, há poucos meses. Não sabia que meu pai, nem Ieié haviam falecido e até segurou o choro. “Quase morri dia desses, contou dando aquela risadinha do rabujento…”

Hoje, soube que o meu querido amigo Macarrão foi pro lado de lá. Se morria de medo de dentista, quem dirá de apitar na curva… Se é mesmo verdade que o morro do Zé da Silva anda mais animado no além, hoje tem festa por lá. Vai com Deus, Gentalha! Mande um abraço a todos.

(Carlos Romero Carneiro)

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