(Por Carlos Romero Carneiro)
Até o início dos anos 80, Santa Rita do Sapucaí ainda não estava na rota dos grandes espetáculos, mas alguns artistas, como Clementina de Jesus e Adoniran Barbosa, chegaram a dar as caras por aqui. Conta-se que até se animaram a tomar uma garapa no Peão Rancho, após as suas apresentações, no Festival da Canção da ETE.
Das minhas recordações de infância, guardo o primeiro espetáculo que vi de um artista famoso, Moacyr Franco, em uma Festa de Santa Rita. O cantor, que também é comediante, executou meia dúzia de sucessos, começou a contar algumas piadas e, quando percebeu que o meu pai estava filmando a apresentação, pediu para que desligasse a câmera porque as suas anedotas eram pouco ortodoxas. Até hoje eu não sei se o meu pai não ouviu os apelos do artista ou se não deu muita bola, mas o cantor queimou no golpe e acabou o show antes do combinado.
Vez ou outra, tomávamos conhecimento de que algum famoso viria se apresentar no Country Clube ou na ETE, mas eu não tinha idade para entrar e as atrações não eram as minhas favoritas. Soube que, em um show de Nelson Gonçalves, o cantor de “Boemia” contratou alguns músicos locais para reduzir os custos e teve problemas para se entender com a banda. Desacostumados com a toada do bolero, os músicos santa-ritenses deram início à música em ritmo de sambão, enquanto o cantor gritava,: “Pá, pára!!!”
Nos meados dos anos 90, um cantor pop chamado Wilson Sideral também veio se apresentar em uma boate daqui. O irmão de Rogério Flausino fazia a sua apresentação em cima de um palquinho, quando se aproximou um moleque sem noção, tirou um chiclete da boca e pregou no cabelo do artista. O sujeito gritou impropérios no microfone, pulou do tablado e cadeiras voaram por todos os lados.
Quem também passou apuros em nossa terrinha foi o vocalista de um grupo de rock conhecido como “Banda das Velhas Virgens”. O rapaz teria parado em uma padaria, antes da apresentação, pedido um volumoso pão com linguiça e, na hora do espetáculo, a sua barriga deu aquela coxada. A coisa foi tão feia, que o sujeito não teve tempo de correr ao banheiro químico. Recorreu a um balde de gelo, cheio de cerveja, que a produção havia deixado no camarim e terminou o serviço em cima do palco. Ele mesmo chegou a contar em seu blog que o barro escorreu perna abaixo.
Uma das apresentações mais lendárias acontecidas por aqui foi de uma banda desconhecida que veio tocar em uma formatura de escola. Era um grupo eclético, montado no início dos anos 60 e que se apresentava com grande desenvoltura. No final do espetáculo, o desconhecido vocalista armou uma barraquinha para vender o seu compacto, mas não teve tanto sucesso quanto gostaria. Vendeu poucos exemplares de um disco com a ilustração de um trenzinho na capa. O tal crooner desconhecido era ninguém menos do que Milton Nascimento, ainda em início de carreira. Presente na noite do baile, Jader Machado Homem, o popular Tchóra, comprou a relíquia e só se deu conta de quem se tratava, muitos anos depois, quando vasculhou as gavetas da casa de sua mãe e reconheceu a lendária ilustração.
Seguindo com as apresentações que marcaram Santa Rita, uma passagem triste ainda é lembrada por quem presenciou a cena. Uma entidade local teria trazido um famosíssimo artista para que a renda fosse convertida em benefício de suas obras. O empresário do sujeito percebeu que o teatro estava lotado e resolveu aumentar o cachê, em cima da hora. O cantor não subiria ao palco caso não pagassem o que ele queria. Para não deixar as quase mil pessoas a ver navios, a organização foi obrigada a limpar o caixa para entregar a arrecadação da noite nas mãos do rei da esperteza.
Mas voltando aos bons shows, lembro que as festas de Santa Rita, do início dos anos 90, foram algumas das mais grandiosas acontecidas na cidade. Se não me falha a memória, todo dia havia uma apresentação de artistas famosos. Fábio Júnior, Fafá de Belém, Sandy & Júnior, Rádio Táxi e até o Buiú da “Praça é Nossa” estiveram presentes nas comemorações.
No Teatro da ETE, vi o Lobão fazer um acústico para meia dúzia de pessoas, um ator conhecido como Cláudio Cunha chamar os estudantes pra porrada quando mexeram com a sua namorada e o Padre Quevedo quebrar um bloco de concreto na barriga de um sujeito, em um evento de parapsicologia. Também soube que, nos anos 60, os grandes festivais fizeram a cabeça da molecada e atraíram diversos nomes de relevância no cenário musical. O meu amigo Miguel turco sempre lembrava da vinda de um tal grupo “Águas”. Tratava-se de uma banda chilena ou boliviana, muito conhecida na época (não encontrei nada sobre eles na internet) e o seu vinil era transparente, novidade na margem de cá do Sapucaí.
Dentre os shows que marcaram a trajetória dos próprios artistas, tivemos a última apresentação do cantor Evaldo Braga. Quando deixou Santa Rita do Sapucaí, ninguém imaginava que o motorista do TL em que o cantor viajava dormiria no volante, ocasionando a colisão com uma carreta. Era o fim da carreira meteórica do intérprete de “Sorria, meu bem. Sorria.”
Após o surgimento de eventos como o gigante Bloco do Urso e, mais recentemente, o HackTown, shows de grandes celebridades viraram assuntos corriqueiros por aqui. O teatro Inatel também tem sido responsável por um importante impulso na cena cultural da cidade, ao ser palco de apresentações relevantes, durante todo o ano. O próprio movimento “Cidade Criativa” já trouxe grandes nomes, dentre eles “Gabriel, o pensador”, que realizou um show memorável na Nova Cidade. Hoje, vemos Ivete Sangalo e Anitta virem tocar no auge do carnaval e isso nem soa tão surpreendente, tamanha a proporção desses projetos. Ao que parece, a nossa vocação para realizar grandes eventos tem sido fundamental neste impulso para promover a “Economia Criativa”, iniciativa que tão bem faz ao comércio e aos habitantes, de maneira geral.
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