Quando encaixotaram a igreja Matriz para mandar para Pouso Alegre

(Por Cônego Carvalhinho)

Como me dei bem com o Cônego Carneiro! Trata­va-o com a deferência que merecia e ele foi meu amigo e confidente, principalmente nas horas mais difíceis de meu paroquiato em Santa Rita do Sapucaí. Havia sido, em 1922, que Mons. João Calazans realizara uma reforma completa na Matriz, colocando, porém, o madeiramento e o forro de pinho. Quatorze ou quinze anos depois, isso em 1936, o cupim já havia trabalhado o suficiente para ameaçar minas no telhado e no teto da velha igreja. Urgia uma nova reforma e o problema agora era exclusivamente meu.

Conversei com o Coronel Francisco Moreira, levei sua opinião ao Bispo que me aconselhou a seguir sua orienta­ção. Por isso, organizamos uma comissão dirigida pelo Seu Chico, da qual faziam parte homens do gabarito de Sanico Teles, João Vilela, Mariquinhas Carneiro (do Capitão), Si­nhá Moreira, Dr. João Capistrano, Alcides Mendes e Dr. Elpídio Costa.

As obras, que já não seriam apenas do telhado e do for­ro da Matriz, mas de seu frontispício e da torre também, foram entregues primeiro, a um tal de Joãozinho construtor. Este porém, mandou fazer um andaime todo fechado de tábuas envolvendo a torre. Perguntado porque tanta precaução ou segurança, respondeu: “Eu sinto tonteiras, por isso, a fim de poder administrar as obras lá no alto da torre, mandei construir este andaime. .. Mas ele mesmo, apesar de providenciar tanta segurança, jamais subiu o morundeu que levantou. Também aquilo serviu de caçoada e chegaram a inventar que o vigário estava encaixotando a torre para despachá-la a Pouso Alegre, para o Bispo. (Re­cordava-se mais uma vez o eterno desdém de Santa Rita por Pouso Alegre. A cidade mais rica não podia rebaixar-se para a que progredia mais).

Um dia o Sanico Teles, que foi quem me indicou o medroso construtor, levou ao conhecimento da Comissão (Sanico era o tesoureiro) de que ia dispensar os serviços do Sr. Joãozinho. Todos os membros da Comissão estive­ram de acordo, e lá se foi e sumiu o construtor que, de longe ou daqui de baixo, queria administrar as obras lá do alto da torre.

Conhecia um rapaz que era um pintor nato, filho do velho construtor De Marchi. Chamava-se Nenê de Marchi. Propus à Comissão que o aceitasse. Era o único capaz de realizar as obras já iniciadas. Orzalino Máximo, outro que poderia assumir, na ocasião andava pelo sertão, cons­truindo nas fazendas do Cel. Moreira e do Sr. José Palma Rennó. Se não aceitássemos os serviços de Nenê de Marchi, teriamos de apelar para um não católico, o que não ficaria bem.

Nenê de Marchi assim me respondeu, quando fui cha­má-lo: “Mas padre, eu sou apenas pintor.” – “Não faz mal, você é inteligente e filho do velho De Marchi. Confio em você.” E no dia seguinte lá estava ele subindo e descen­do os andaimes da torre, do frontispício e de toda a igreja.

E a torre ficou onde estava. Não foi despachada para Pouso Alegre. Na festa de Santa Rita de 1940, inauguramos a grande reforma da Matriz, quando também benzi e pus a funcionar o Relógio de Michelini & Micheloni, que resiste até hoje e que foi resultado do trabalho do Dr. Elpídio Costa, de saudosa memória.

Norman Bytes

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