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Dos campos de concentração de Java para Santa Rita do Sapucaí

Com 38 vulcões, Java é a principal ilha da Indonésia, onde se situa a capital do país, Jacarta. Com cerca de 127.700 km² é a ilha mais povoada da Indonésia e uma das regiões mais densamente povoadas do planeta. É naquela terra distante que nasceu um homem que colecionaria inúmeras histórias, até se tornar um dos mais reconhecidos professores de nossa cidade. Nascido em Malang, em 1937, Arthur François de Gruiter é descendente de holandeses, colonizadores da Indonésia. Seu pai era eletricista e sua mãe, também holandesa, dona de casa. Aos 4 anos, a infância de François foi parecida com a da maioria dos meninos de sua idade até que, em 1942, a Indonésia foi invadida pelo exército japonês, seu pai tornou-se sargento e, em um combate, foi capturado e enviado para um campo de prisioneiros no Japão, onde permaneceu até o lançamento das bombas de Hiroshima e Nagasaki.

Com o início da II Guerra, François e sua mãe viram a casa ser confiscada e foram obrigados a se mudar para uma espécie de gueto de holandeses. Duas ou três vezes por semana, eram surpreendidos com bombas e ataques terrestres e precisavam correr para um abrigo a fim de se proteger.

Quando o Japão assinou o termo de rendição aos aliados, tudo parecia ter voltado ao normal, mas as turbulências políticas ocasionadas pela ocupação estrangeira propiciaram um movimento de independência na Indonésia. Com o início da revolução, o pai de François foi novamente convocado para defender o exército holandês e sua família enviada para um campo de concentração. “Esse período foi bem pior do que na II Guerra porque não tínhamos o que comer e éramos muito mal tratados”. A alimentação de François, então com 8 anos de idade, era uma sopa rala que mais parecia água suja. Quando teve um começo de disenteria, teve que ingerir carvão como tratamento alternativo. Como o campo era cercado por bambu, sua mãe esperava uma folga dos soldados para encontrar uma fresta e trocar os pertences por comida.

Em 1947, François foi libertado do campo de concentração e, alguns anos depois, seu pai decidiu se mudar para outro país. Por não ver perspectivas na Holanda, sua família cogitou viajar para a Austrália, mas temeu sofrer preconceito racial. Entre Nova Guiné e Brasil, foi aconselhado a rumar para a América do Sul, onde receberia respaldo do Serviço de Imigração Holandesa.

A viagem ao Brasil durou quarenta e seis dias. Assim que o navio zarpou, uma enorme tristeza e emoção tomaram conta do holandês: “Quando vi a terra se distanciar, soube que nunca mais voltaria.”

No dia 7 de agosto de 1955, o navio chegou à baía de Guanabara e os estrangeiros foram enviados à Ilha das Flores, considerada o paraíso dos imigrantes. François sentiu medo ao se deparar com uma terra completamente desconhecida, onde não poderia conversar em holandês, muito menos em malaio – língua das ruas, em Java.

Após um mês de espera, o Serviço de Imigração conseguiu um trabalho na cidade mineira de João Monlevade. Enquanto seu pai atuaria como eletricista, o rapaz, que estava prestes a completar 18 anos, foi contratado como operário.

Nos 4 anos em que trabalhou na Belgo Mineira, François tentou por várias vezes estudar, mas não obteve sucesso. Apesar de trazer de Java um certificado de conclusão do ginasial, o documento não foi aceito no Brasil e ele teve que apelar até para cursos por correspondência. Por sorte, foi convidado por um professor a realizar um curso de “Madureza Ginasial” e teve a chance de viajar para Vitória (ES), onde faria os exames. Na primeira tentativa, François conseguiu passar em quase todas as matérias, inclusive Português, mas não obteve êxito em Latim e História do Brasil. Seis meses depois, retornou à capital capixaba e conquistou o tão sonhado diploma.

François ainda se lembra do dia em que tomou conhecimento de Santa Rita: “Em 1960, o santa-ritense Guido Portugal leu uma reportagem sobre a ETE, no Estado de Minas, e me incentivou a vir prestar o vestibular.”

Após sair o resultado dos exames, a futura esposa de François ouviria falar sobre um tal habitante de Java, pela primeira vez, quando seu pai, o senhor Antônio de Cássia, chegou contando em casa que um estrangeiro havia passado em primeiro lugar. “Eu lembro que corri até o Atlas para descobrir onde ficava a ilha. Como não sabia da história de François, imaginei que a ETE deveria estar famosa no mundo inteiro, para ter atraído alguém de tão longe.” – relembra Maria Aparecida Cássia de Gruiter, esposa de François.

Em Santa Rita, o estudante passou a residir no Hotel Melo. “As primeiras pessoas que eu conheci foram o Dr. Mário Brandão, o Róssio De Marchi e a Maria Nazaré.” Ao se formar na terceira turma da ETE, em 1964, o então técnico em eletrônica foi convidado pelo diretor Pe. Vaz a lecionar. Dois anos depois, iniciaria os estudos no Inatel. Após a formatura, no final de 1968, ele já pensava em se casar, mas resolveu aguardar um pouco já que a ETE o enviaria para fazer um treinamento na Alemanha. Como a viagem demorou a sair, François se casou, em janeiro de 1970, e soube que iria permanecer 4 meses fora do Brasil.

No ano seguinte, o javanês começou a lecionar também no Inatel e, em 1973, tornou-se professor da EFEI. O renomado professor apenas deixou a ETE quando decidiu fazer Mestrado, já na gestão do Pe. Raul Laranjeira. A paixão pela educação o acompanhou por toda a vida e, ao se aposentar, em 2007, decidiu que chegava a hora de descansar um pouco. Contrariando as expectativas, François trabalha com dois de seus três filhos (André, Arthur e Adrienne) e continua a prestar sua importante contribuição à comunidade santa-ritense, sempre solícito no que for necessário.

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