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Como um santa-ritense tornou-se um dos maiores músicos do país

Décio Romero Júnior, mais conhecido como Buga, nasceu e cresceu no bairro da Rua Nova e, através das lições de Antônio Anésio Felipe, o Tonico, partiu para aprimorar o seu talento e tornar-se um dos maiores músicos brasileiros. Confira como teve início a sua trajetória até trabalhar com nomes como Milton Nascimento, Racionais e Emicida.

De onde vem esta sua paixão pela música?

O que eu trazia comigo, antes de aprender música com o Tonico, eram acontecimentos que presenciava no bairro da Rua Nova. Perto do grupão, acontecia um evento de Breaking que eu gostava muito, sem imaginar que, anos depois, viria a tocar no Racionais. Havia, também, as batucadas que ajudaram a criar em mim um gosto pela música. Por outro lado, tenho conhecimento de que a minha família produziu algumas das primeiras manifestações da Congada em Santa Rita. Tudo isso potencializou quando eu passei a ter aulas com o Tonico!

E como isso aconteceu?

Eu era muito novo… Estava, certo dia, andando de bicicleta em frente à minha casa e assobiando, o Tonico ouviu e disse que eu tinha inclinação para a música. Ele, então, me convidou a estudar com ele! Mas nós sempre fomos muito próximos! Eu cresci sem a presença paterna, sou filho de mãe solteira e quando estava jogando bola na rua e o Tonico passava, meus amigos zoavam que ele era o meu pai! Dali em diante, comecei a ter aulas com ele mas morria de medo porque tinha fama de ser muito bravo! Foi tudo de bom na minha vida! Ele me ensinou a me comportar como pessoa, me contou como os músicos se apresentavam na época dele e como eu deveria me preparar. Tudo isso era ensinado por Tonico, além da música! Eu tive a oportunidade de vê-lo tocar por diversas vezes e era um músico excelente. Lembro que, uma vez, fui tocar Wave, tirei a música de forma errada e ele tocou para corrigir a música! Tonico dava muitas dicas e me ensinava muito até que chegou um dia que ele me disse: “Não tenho mais nada para lhe ensinar. Agora é fechar os olhos e fazer o que você tiver vontade!”

E qual foi a sua reação?

Eu fiquei completamente perdido porque eu tinha o Tonico como um guia para a vida! Mais tarde, eu compreendi esta relação quando li sobre uma lição indiana que dizia que um mestre teria importância na vida do aprendiz até a sua morte. Que jamais deixaria de ser um guia. Então tudo o que ele pedisse, dali para a frente, eu deixaria os meus afazeres e iria atendê-lo. Esta passou a ser a nossa relação. Depois que as aulas acabaram, eu continuei frequentando a sua casa, entregando discos para ele e prestando o respeito que ele tanto merecia.

Aquela lenda de que você ensaiava dentro do guarda- roupa é verdadeira?

Sim! É real! Os meus vizinhos não gostavam muito do barulho, eu precisava ensaiar e, para respeitá-los, resolvi tocar dentro do guarda-roupa! Eu gostei tanto da experiência que continuei fazendo aquilo. Não ouvia nada fora, ninguém me incomodava e eu ficava suando lá dentro!

Quando você comprou o primeiro saxofone?

Lembro que a minha mãe disse que iria me dar um presente de natal, mas que não seria bem o que eu queria, por causa do preço. E ela chegou em casa com um cavaco! Só depois de uns quatro ou cinco meses que o Tonico percebeu que eu estava levando as lições a sério e resolveu me vender o seu sax por um preço insignificante. O primeiro sax que eu tive era o instrumento que ele tocava nos bailes e fiquei anos com ele! Tenho até hoje!

Como surgiu a oportunidade de você se profissionalizar?

Acredito que tenha começado no evento Festitel, que venci por dois anos. Aquilo me deu uma base de como as coisas são feitas. Me mostrou como acontecia a construção de uma composição e como novos elementos eram aplicados para formar uma ideia. Aquilo foi um começo do que faço até hoje. Mas eu também não sabia se iria dar certo! Eu só fui! O Thyers Adami, que tocava chorinho comigo na época, me apresentou ao Roberto Sion e, dali para frente, comecei a me apresentar com ele! Nessa mesma época, conheci um cara chamado Gustavo Carvalho, compositor de música instrumental que havia feito parte da banda Toque de Midas. Era o baixista da banda. Recentemente, ele ficou entre os 20 selecionados ao Grammy. Desses contatos e participações em produções autorais, foi que passei a acreditar mais no meu trabalho.

Quando surgiu a oportunidade de tocar no Racionais?

Passei a tocar com o Racionais em um momento em que já estava pensando em parar. Eu estava fazendo faculdade, encontrei um amigo de outros trabalhos chamado Ed, que tocava trombone, e ele resolveu me apresentar ao Racionais. Era para ser só um show, mas também fui convidado para a turnê do ano seguinte e depois veio a pandemia. Desde então, gravei o DVD com eles em outubro e o AmarElo, do Emicida, no mês seguinte.

E você aprendeu muito com os Racionais?

Tudo o que sei sobre ancestralidade eu aprendi com eles! Aprendi muito sobre música também. Eles nos incentivam a ouvir sons que eles consideram o tesouro do país! Eles comentam: “Como você não ouve funk? Tem que ouvir!” E passamos a entender questões de preconceito e outros assuntos!

E como foi com o Emicida?

A oportunidade de tocar com o Emicida já surgiu através da visibilidade que ganhei com o Racionais! Eles me viram no show, gostaram e me chamaram para tocar! Foi uma ocasião em que a minha tia estava doente, fiquei muito preocupado e quase desisti de gravar aquele show! Mas foi de uma importância enorme na minha vida! Eu me lembrei, naquele momento, que a minha tia havia feito parte da Associação José do Patrocínio, que o Quita também tinha tomado parte da diretoria e aquilo tudo passou a fazer sentido pra mim!

Qual é o seu projeto atual?

Tenho tentado produzir um trabalho autoral que represente tudo o que eu vi e vivi na Rua Nova. Eu tenho contato com um cara chamado Wanderlei Silva, percussionista da última turnê do Milton Nascimento e estou criando as melodias para ele participar comigo da produção.

E o seu contato com o Milton?

O Gustavo Carvalho foi quem me levou para conhecer o cara. Fiquei tão nervoso que travei na hora! Ele me passava uma energia muito boa! Ainda voltei na casa dele algumas vezes para gravar umas músicas e minha reação, quando ficamos sozinhos, foi rir sem parar, de nervoso, o que chegou a irritá-lo. Na saída, ele pediu para eu tomar a bênção dele e também beijou a minha mão. Experiência incrível!

Norman Bytes

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