(Por Carlos Romero Carneiro)
Através desta caderneta datada de janeiro de 1929 e que estava perdida há muito tempo em uma gaveta da antiga residência situada na esquina da Rua do Bepe com a Rua da Pedra, tivemos contato com o boletim de uma tal Durcilina de Souza. Durcilina… Naquela época, os professores não preenchiam o boletim com o nome correto da criança, mas como eles se referiam a ela. No momento em que a fotografia foi tirada, a menininha de rosto redondo e feição humide, não tinha ideia das dificuldades que passaria quando o pai, Vicente Souza, ficaria sem receber a venda de sua pequena lavoura, por conta da quebra da bolsa de 1929, que acabou levando boa parte dos agricultores à falência.
O nome correto da menina da Piedade era Dulce de Souza. Virou Durcilica para os amigos, depois Cilica… Quando o filho de espanhóis, Matheus Romero Filho, venceu a resistência dos pais da menina e conseguiu ajeitar o casamento, Dulce ganhou o sobrenome do agricultor que arrendara terras do outro lado da Serra do Mata Cachorro para plantar de tudo um pouco e vender suas mercadorias em um tapete em frente ao velho mercado. Como a Piedade era caminho para Santa Rita, meu avô cruzava com “Durcilina” que vinha a pé pela estrada ao lado de seus pais e deu um jeito de conquistar a menina com quem viveria até os 93 anos de idade, quando ele faleceu. O primeiro contato foi quando ele esperou que ela saísse da roda gigante, na Festa de Santa Rita, e pediu para bater um papo. Acabou em casório com direito a foto em frente à igreja velha de Aparecida do Norte.
Com o passar dos anos, meus avós se mudaram para a esquina entre as ruas da Pedra e do Bepe, onde montaram armazém. A experiência com a vida no campo possibilitou que cultivassem suas próprias frutas e hortaliças, plantassem e enrolassem o fumo que comercializavam na venda, criassem porcos e galinhas e tivessem seus oito filhos.
Observando a fotografia tirada quando Dulce terminava o terceiro ano primário, aos 12 anos da idade, imagino como deveria ser difícil a vida naqueles tempos. E sei que aquele olhar humilde da fotografia não tinha ideia dos revezes que encontraria, nos noventa e três anos seguintes. Talvez pela enorme dificuldade que encontrou com a morte do pai, meu avô teve que sustentar a mãe e seis irmãos, ainda na adolescência, fato que faria dele uma pessoa austera e econômica. Apesar de nunca ter aberto conta em banco, terminou a vida abastado, mas nunca teve regalias. Meu avô sabia que, quando conseguia encher uma caixinha de papel de cartas com dinheiro, já dava para comprar uma propriedade e aquela passou a ser a régua de sua vida. Ainda lembro quando minha avó encontrou, muitos anos depois da morte do marido, uma daquelas caixinhas, cheia de notas sem valor e cheques de bancos que já não existiam, no fundo do guarda-roupas… Começou a chorar… “Tanto sofrimento…”
A menina da foto faleceu no dia 16 de novembro de 2021, aos 105 de idade. Até hoje, seus filhos e netos ainda se reúnem, uma vez por ano, para comemorar o seu aniversário e celebrar a vida. Viva Dona Dulce!
Como foi aquela velha história do juiz, durante a lei seca? Em dia de eleição,…
(Carlos Romero Carneiro) Um pequeno túmulo no corredor central, quadra de número 6, muitas vezes…
(Por Elísio Rosa) Moleque faz molecagem. Entre as múltiplas molecagens, cito aqui uma que trazia…
(Por Ivon Luiz Pinto) A Bíblia nos conta que Jesus dormia no barco durante uma…
(Por Rita Seda) Junho, sendo um mês tão frio para nós, é um mês de…
Artista conta como seus pais (Carlinhos do Ítalo e Alaíde) e seu marido (Leandro), influenciaram…